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Mais Abraços // Sexta-feira 16 Setembro, 2022 // #mae, #bebe, #emocoes
Em uma pesquisa rápida no Google, o significado de “neuroatípico” é quase sempre o mesmo: refere-se a qualquer pessoa que tenha algum transtorno no funcionamento psíquico, como autismo, transtorno de coordenação do desenvolvimento, déficit de atenção ou hiperatividade. É dentro desse espectro que se encontram as crianças neuroatípicas. Seu oposto são as “neurotípicas”, ou seja, que apresentam um funcionamento típico das funções cerebrais, aquelas consideradas “normais”.
Indo ainda mais longe, há o termo “neurodiversidade”, o grande guarda-chuva que engloba todos esses termos. O irônico é que, quando o termo nasceu, ele não buscava ser um diagnóstico e muito menos uma ferramenta de exclusão, mas sim de inclusão. “A ideia é a de que todas as pessoas são diferentes, porque possuímos funcionamentos neurológicos distintos, da mesma forma que temos peles diferentes. Idealmente, não teria a ver com um diagnóstico em si, teria a ver mais com um conceito de diversidade humana”, explica a doutora Rachel Monteiro Lorencini, médica generalista e pós-graduanda em psiquiatria e saúde mental.
O fato é que hoje o termo “neuroatipicidade” cunha todos aqueles que destoem, ainda que ligeiramente, dos parâmetros neurológicos tidos como “normais” — e isso vai do adulto à criança. Os dados sobre quantidade de neuroatípicos também são incertos: sabe-se que as mulheres são menos diagnosticadas, em uma proporção de uma mulher para cada quatro homens. E os motivos são, sobretudo, culturais.
Mas não há dados oficiais cravados em nosso país, nem mesmo a respeito da infância. Segundo este artigo, a prevalência de pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) aumentou. Em 2004, o número divulgado pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) era de que 1 a cada 166 pessoas tinham TEA.
Em 2012, o número subiu: 1 pessoa a cada 88. Em 2018, esse número estava em 1 a cada 59. Na publicação mais atual, de 2020, a prevalência está em 1 a cada 54. Os dados divulgados atualmente mostram, então, uma prevalência de 1 pessoa com autismo para cada 54 crianças de 8 anos e, apesar de serem dados referentes aos Estados Unidos, o Brasil costuma se basear neles para entender o cenário por aqui.
“Estima-se que 90% dos autistas nunca chegam a ser diagnosticados, e muitos adultos seguem sem saber, porque possuem algo para compensar, uma alta habilidade, por exemplo. O autista geralmente tem muita dificuldade de relatar o que sente, ele só sabe que é diferente, e para muitos médicos pode parecer muito abstrato, mas é o que a pessoa consegue relatar”, explica Rachel.
A própria médica, que hoje se reconhece como autista, passou por toda a sua juventude sem saber o que havia de “errado” com ela, sobretudo no que diz respeito à socialização. Rachel nos lembra de que há diferentes espectros e que é preciso abandonar velhas convicções.
“Eu sempre tive um olhar do autismo como atraso de fala, de desenvolvimento, o mais clássico. E nosso filho nunca teve isso, teve um desenvolvimento até que típico para quem olha de fora, e suas escolas nunca tiveram demandas em relação a ele, pediram para avaliar ou falaram qualquer coisa do relacionamento dele. Só que, nesse dia, ele chorou muito, estava inconsolável e tudo porque ele não conseguiu terminar uma tarefa a tempo. Achei estranho, mas o gatilho principal, para mim, foi quando percebi sinais de rigidez em seu comportamento, como, por exemplo, ele escolhia o formato da pipoca que ia comer”, relembra Rachel.
Foi nessa investigação para diagnosticar o próprio filho que a médica primeiro identificou sinais neurodivergentes em seu próprio marido e, posteriormente, em si mesma. Problemas de comunicação, explicação e socialização eram suas principais dificuldades, além de uma dificuldade para coordenar a expressão facial com o conteúdo que ela estava dizendo. “Se eu chego e falo que eu estou deprimida, mas eu não faço cara de triste, aquilo que eu falei não vai ter o mesmo impacto”, explica.
A partir de 2020, com o isolamento social e a convivência mais intensa dentro de casa, tornou-se evidente para muitas pessoas sinais que até então não eram notados. “Muitas pessoas começaram a perceber dificuldade no dia a dia, na organização mesmo. A sensação é de que a gente demora mais para fazer as coisas, então nossa alimentação, por exemplo, era sempre a mesma, pensar em algo novo me tomava muito tempo”, diz.
“Sempre usei recursos de antecipação, contar para ele [o filho dela] antes o que vamos fazer, coisa que ninguém fazia comigo e eu preferiria que tivessem feito, porque, para muitos autistas, essa organização é fundamental. São modificações simples no dia que fazem toda a diferença”, explica Rachel.
Rachel acredita que o autismo deveria ser como a identificação de gênero, que um dia já foi da alçada médica e hoje é uma percepção e reflexão da própria pessoa sobre si mesma. Aos médicos, ficaria somente o que dissesse respeito aos problemas sintomáticos que poderiam surgir, como uma depressão ou um pânico.
Mas, para que haja esse nível de conhecimento sobre o tema da neurodivergência, é preciso que haja, consequentemente, maior comunicação acerca dele, começando ainda na educação básica. “Idealmente, teríamos, ainda nos primeiros anos, uma abordagem que indicasse diferenças sensoriais entre as pessoas desde cedo”, diz Rachel.
“Algumas linhas trabalham com esse estudo do processamento sensorial e se ele estaria relacionado a algum transtorno. A gente não foi educado para identificar as diferenças sensoriais de cada pessoa e, por isso, achamos que todo mundo vê igual, escuta igual, que o toque é igual para todos. Uma sala de aula cheia de estímulo visual, para uns, pode ser estimulante, para outros, pode sobrecarregar; a mesma coisa a carga horária e os sons. Nada disso é levado em consideração”, pondera.
Para ela, é preciso que o trauma seja menos supervalorizado. Isso porque, por muito tempo, qualquer sinal neuroatípico em crianças era tido como reflexo de alguma situação a que ela foi exposta, principalmente vinda dos pais. Mas a realidade é que esses próprios pais podem ter sido não diagnosticados por toda a vida e já se sabe que de 80 a 90% das crianças autistas herdaram essa condição a partir da genética.
Por fim, Rachel cita as terapias de integração sensorial, feitas por um terapeuta ocupacional, como um grande potencial terapêutico para seus pacientes. “A integração sensorial trabalha os estímulos que podem impactar na vida dessa pessoa, discutindo a adequação do ambiente, por exemplo”, conclui.
* A especialista consultada sobre esta matéria foi ouvida como fonte jornalística, não se utilizando do espaço para a promoção de qualquer produto ou marca.
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